Quando se calar protege — e quando falar transforma Sobre assertividade, autorrespeito e o que muda quando nos posicionamos de forma consciente
Nem sempre conseguimos dizer o que sentimos. Em muitos vínculos, especialmente os mais antigos ou emocionalmente carregados, a palavra se torna um campo de risco: se digo, posso perder; se silencio, me perco.
Por isso, tão comumente hesitamos: vale a pena falar? Vão me ouvir ou me punir? Melhor recuar, ou tentar de novo?
Essas perguntas são legítimas — e cada resposta dependerá do contexto, da história da relação e do que está em jogo. Mas há algo que não muda: comunicar-se com respeito e clareza não é apenas uma forma de se proteger. É uma maneira de transformar.
Assertividade não é gritar verdades nem aceitar tudo para manter o clima. Não é agradar, mas tampouco agredir. É uma forma de sustentar o que importa com firmeza e humanidade. Quando aprendemos a dizer não sem culpar, a fazer pedidos sem exigir, a colocar limites sem destruir a ponte, algo no outro também se movimenta. Talvez ele não mude imediatamente. Mas a atmosfera muda. A forma muda. E o que parecia uma repetição sem fim pode, enfim, ganhar uma fenda.
Claro, há relações em que um gesto de afirmação provoca retaliação. Há pessoas que se defendem atacando, e grupos que respondem à divergência com exclusão. Nesses casos, o autorrespeito inclui avaliar riscos: minha integridade está protegida? Estou sozinho nessa conversa? Que custo posso arcar por me posicionar? Há outro momento, outra forma, outro caminho?
O importante é saber que o silêncio também comunica. E que nem sempre se calar é submissão: às vezes, é uma escolha tática para proteger o que ainda não está pronto para ser exposto. Mas quando o silêncio se torna rotina, quando o corpo se cala junto com a voz, quando o vínculo exige ausência de si como condição de permanência, algo precisa ser revisto.
A linguagem é uma ponte. Não apenas entre duas cabeças, mas entre duas histórias. Quando uma pessoa se comunica com clareza e respeito, ainda que o outro não esteja pronto para compreender, o campo relacional se altera. Pode ser uma mudança sutil, quase imperceptível. Mas uma vez dita a verdade, ela não se recolhe por inteiro. Ela fica ali, como convite, como reflexo, como possibilidade.
E às vezes é isso que basta para que, mais adiante, o outro comece a escutar. Ou, ao menos, para que você mesmo se escute de novo.
Porque o autorrespeito não exige vitória. Exige apenas que, mesmo diante do medo ou da dúvida, você se trate como alguém que merece ser considerado.
Mesmo que não seja hoje. Mesmo que seja em voz baixa. Mesmo que comece por dentro.
Sobre o autor:
Dr. Fábio Fonseca
Psiquiatria e Psicoterapia
Com mais de 20 anos de experiência como psiquiatra e psicoterapeuta, o Dr. Fábio é conhecido por sua abordagem humanizada e pelo compromisso em oferecer cuidados de saúde mental baseados nas mais recentes evidências científicas.
Vamos caminhar juntos em direção a uma saúde mental mais equilibrada e satisfatória.
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